Estudar Global Law em Tilburg – Parte 3
Para quem me acompanhou no curso de Global Law, parte 1 e 2, aqui eu encerro a saga do meu curso e falo também de quais os prospectos depois de formada. Depois de muito sangue, luta suor e lágrimas, confere aqui como foi o último ano.
Terceiro ano
Nesse ano teve uma novidade: agora o pessoal poderia fazer intercâmbio! O intercâmbio seria feito no último semestre, e como foi arranjado de última hora, as opções eram um pouco limitadas. Mas teve gente da minha sala que terminou os estudos em Singapura, Espanha, e até no Brasil (um colega meu foi estudar Global Law na FGV). Fica a dica aí que a oportunidade existe, apesar de ter começado como algo atrapalhado no último semestre. E imagino que agora a lista de destinos tenha crescido também.
1º Semestre
Administrative Law
Essa matéria foi uma continuação de Constitutional Law, do segundo ano. Também tivemos professores dando diferentes módulos, o que ajudou a quebrar um pouco a monotonia. Porque já te falo agora o que a professora mencionou logo no primeiro dia: essa matéria é chata. Muito burocrática, muito teórica. Mas tem quem goste.
Civil Procedure and Dispute Resolution
Essa foi a matéria mais prática que tivemos em todo o curso. A nota final consistiu basicamente de um projeto individual, em que cada um tinha que criar um sistema alternativo de resolução de conflitos.
O lado ruim é que tivemos que bolar um sistema diferentão sem nem ter entendido os tradicionais direito.
O lado bom: os 5 melhores trabalhos receberam destaque. Dentre esses cinco, dois foram selecionados para apresentar em um congresso no Palácio da Paz em Haia, que é sede da Corte Internacional de Justiça da ONU. Chique, não?
Eu fiquei entre os 5 melhores, mas não entre os 2 que apresentaram. :( Tudo bem, a gente enxuga as lágrimas e vida que segue.
Não sei como está a estrutura dessa matéria no momento, mas achei que a ideia foi bem bacana.
Legal Philosophy II
É bem teórica, com foco nos diferentes pensadores e filósofos. É interessante a nível de doutrina, mas não vimos nada muito prático. Ela é relevante quando se discute qual a vertente de pensamento que um juiz pende ao dar um julgamento, por exemplo.
Obligations and Contract Law II
Foi melhor do que Contract I. A matéria foi dividida entre direito do consumidor e direito do trabalho, então foi bem útil. Não sei como está a avaliação agora, mas nós tivemos que entregar dois trabalhos individuais e só. Foi relativamente tranquila.
Private International Law and Transnational Litigation
Gostei bastante dessa matéria. Tivemos a chance de debater vários casos reais e pertinentes, como o vôo MH17 que foi abatido em 2014 e causou comoção mundial. Também pudemos usar uma salinha com vídeo conferência, então a minha turma e uma turma da Alemanha assistia a mesma aula, um vendo ao outro através da TV. Foi demais! Um pouco estranho, mas muito “bem vindo ao século XXI”.
2º Semestre
Accounting and Finance for Lawyers
Essa foi de fazer o pessoal de humanas tremer. Não é difícil, principalmente para os padrões brasileiros. A parte da matemática é bem tranquila e o professor é bem loucão. Não criemos pânico, people.
Public International Law
Eu simplesmente me apaixonei por essa matéria, e isso se deveu 100% ao professor. O chefe do departamento de direito internacional público foi quem deu as aulas, e ele é muito bom. Vimos muito além da teoria e tivemos várias discussões em sala. Inclusive conversar com ele me deixou muito dividida, já que até aquele momento eu sempre tive a certeza de que queria fazer o meu mestrado em Leiden. Quis continuar em Tilburg só por causa dele haha.
Tax Law
Sabe aquela matéria que a turma inteira entra em histeria coletiva? Pois é.
Mas no fim deu tudo certo. O problema não era a matéria em si, e sim a falta de estrutura e organização do professor. Espero que tenha sido corrigido.
Final essay
A tese do pessoal de Global Law é bem diferente dos outros cursos. Não foi um TCC comum, e sim um caso que você tinha que defender. Haviam duas situações: uma em um tribunal, e outra como uma reunião de conselho de empresa. Quando eu fiz, você simplesmente era designado uma dessas situações, o caso e o seu papel – não dava para escolher nada. Aparentemente agora dá. Então você tem a parte escrita, na qual deve-se argumentar a sua posição, e a simulação do tribunal/conselho com todo mundo. Foi um pesadelo, eu pessoalmente odiei não poder escolher o que eu iria fazer, mas no fim deu tudo certo.
Além disso, no último semestre você deve escolher uma matéria opcional, dentre essas opções:
A faculdade tentou ao máximo disponibilizar as matérias em horários diferentes para que os alunos pudessem pegar mais de uma eletiva, se assim quisessem. Mas na prática, as coisas foram emocionantes o suficiente só com uma haha.
E depois?
Como eu já expliquei aqui, os cursos de ensino superior na Holanda funcionam um pouco diferente. Se você escolheu fazer um curso em uma universidade de pesquisa tal como Tilburg, só o bacharelado não é o suficiente. Só os 2 ou 3 anos em Global Law dificilmente irão te garantir uma vaga. Você tem que pensar nesse curso como uma base que vai te abrir todo um leque de oportunidades; como você estuda todas as áreas do Direito, vai poder escolher qualquer uma delas para o seu mestrado sem problemas. Eu tenho colegas que decidiram ir para a área de finanças, outros para a área pública. Uns em direito ambiental, outros em direito administrativo. Como todos os cursos multidisciplinares, isso pode ser uma benção ou maldição, mas eu prefiro pensar que como sei um pouco de tudo, isso é mais importante do que saber muito de uma coisinha de nada. Mas na minha opinião, essa graduação possibilita um mestrado em qualquer área do direito que você quiser.
Posso ser um advogado na Holanda?
Depende. Como está o seu holandês?
Para ser advogado na Holanda, você precisa ter aulas sobre o direito holandês (em holandês, com os holandeses, óbvio) tanto na graduação como no mestrado. Então a sua carga horária é maior do que quem está só cursando Global Law. Além disso, depois de se formar a pessoa passa por uma espécie de processo de trainee, que dura 3 anos. Nesses 3 anos, há uma série de provas que seria o equivalente da nossa OAB. Só após terminar tudo isso você será qualificado para advogar nos Países Baixos. Ufa! Mais difícil que no Brasil, né?
Claro, para ser um consultor ou conselheiro em alguma empresa, aí você não precisa se preocupar com essas coisas mesmo. Por isso é extremamente importante avaliar qual o seu objetivo e qual curso melhor te atende. ;)
>>Ficou curioso sobre estudar na Holanda? Confira esses posts:
Como funciona as faculdades holandesas
Você sabe se com a inscrição na ordem de advogados de Portugal não dá para advogar na Holanda?
Fiquei curiosa para saber seu nível de inglês quando chegou, deu para fazer legal as matérias?
E o holandês? É muito ruim de aprender?
Estou pensando em fazer mestrado na Tilburg :)