Gentileza gera gentileza

Essa situação aconteceu a no meu primeiro mês na Holanda. Foi o que me fez ter uma a primeira impressão fantástica dos holandeses. Envolve mudança, um colchão e muita chuva.

Quando eu cheguei na Holanda, não tinha casa. Encontrar acomodação para estudante é sempre difícil, e como comigo tudo aconteceu de última hora, foi ainda mais difícil. Reservei um hotel e tinha uma semana para encontrar um lugar para morar. E encontrei. Esse post refere-se ao dia que larguei a minha condição de sem teto e fui para a minha casinha.

Chamei o táxi, e quando ele chegou estava uma chuvinha chata. O motorista se assustou com o tamanho da minhas duas malas singelas de 32 kg, ao que eu falei para ele me dar um desconto já que eu estava mudando de país. Ele riu, carregou as duas malas na chuva, e ainda abriu a porta do hotel e do táxi para mim. Foi o caminho inteiro conversando comigo, perguntando da minha vida no Brasil, o porquê de eu ter escolhido a Holanda e o que eu iria fazer depois de terminar o curso. Simpático até demais (eu sou uma pessoa naturalmente mais fechada).

Ao chegar na casa, eu tinha dois problemas para resolver. O primeiro era comprar um colchão, e o segundo era conectar na internet e avisar família, amigos, vizinhos, cachorro e papagaio que eu estava em casa, sã, salva e não tinha sido atacada por um tamanco ou algo assim.

A casa aonde estava morando é só de meninas, e eram muitas. Zanzei um pouco e não cruzei com uma alma viva. Claro que eu poderia sair batendo de quarto em quarto, mas decidi não transparecer toda a minha loucura logo no primeiro dia. Fiquei teimosamente sentada na sala esperando alguém aparecer. Quando finalmente apareceu uma menina, pedi para ela peloamordedeus me falar em qual loja ali perto eu poderia comprar um cabo para conectar na internet, e se ela poderia me dar indicação também de lojas de colchões. Eu estava com o celular na mão aberto no Google Maps, e ela se mostrou o mais solícita possível, me mostrando direitinho aonde eu precisava ir. Me deu vontade de abraçá-la. Me contive. Agradeci mil vezes e segui de guarda chuva em mãos, porque o dia continuava chuvoso (não esperava nada menos de você, Holanda).

Primeiramente fui comprar o cabo para o computador. Os atendentes prontamente me ajudaram. Puxaram papo perguntando de onde eu era, sempre com aquela surpresa boa por eu ser do Brasil (uma reação bem comum). Foram muito solícitos mesmo eu não falando nada de holandês, e saí da loja bem feliz.
Uma holandesa que eu conheci logo no primeiro dia me indicou uma loja de ponta de estoque que vendia colchões bons e mais baratos. De fato, depois de zanzar por algumas lojas ainda meio perdida de tudo, percebi que lá era o melhor lugar. Comprei um travesseiro e um colchão com garantia de 3 anos por um preço muito bom. Mas – como sempre – tinha um problema. Era sábado, por volta de meio dia. Perguntei para o vendedor/caixa/dono(?), já me encolhendo, se não haveria alguma chance dele entregar naquele mesmo dia. Ele segurou uma risada. Disse que não, pois a van que fazia entregas já tinha saído de manhãzinha e a essa altura deveria é estar em outra cidade.

Eu respirei fundo, tentando não me desesperar. Olhei para ele com a cara do gatinho do Shrek, e perguntei se não havia algum jeito de entregar no próprio sábado. Que eu havia pego a chave e me mudado naquele mesmo dia, então não tinha como eu ter comprado antes nem que eu quisesse. Que se ele não entregasse o colchão eu iria dormir direto no estrado da cama.
Ele ponderou um pouco e disse que daria um jeito. Perguntou o meu endereço, e disse que após fechar a loja, entre as 17h e 18h, iria fazer a entrega para mim do carro particular dele. E ainda indagou se aquele horário era bom para mim.

 

Até hoje fico incrédula ao lembrar disso. Nem no Brasil eu imaginaria uma coisa dessas, de uma pessoa se compadecer com você e se prontificar a entregar em um sábado, após o expediente, usando o próprio carro. Novamente me veio aquele anseio de abraçar e agradecer a pessoa em lágrimas. Novamente me contive. Confesso que na minha cabeça já me imaginava colocando todos os lençóis que eu trouxe dobrados por cima da cama, e também forrando com o meu casaco de inverno. E me cobrindo com um moletom ou algo assim, ao passo que fazia a mochila de travesseiro.

Acho que esse homem não tem ideia da boa ação que ele fez.

No final, mesmo em um dia com aquela chuvinha preguiçosa, consegui arrumar todo o meu quarto, desfazer as malas, e o colchão chegou mais tarde, como prometido.

Paula com casa, Paula com internet, Paula com colchão. Paula feliz.

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